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H-orizontes

H-orizontes

07
Jul24

“Triunfal”, de Aquilino Ribeiro, e o Mito da Caixa de Pandora

Helena

No seu conto Triunfal, Aquilino Ribeiro reconta o episódio genesíaco do Pecado Original. Apesar de diferir do texto bíblico em vários aspetos, entre eles a transposição do momento em que Eva morde o fruto proibido para um espaço mítico erotizado em que o pomo proibido consiste na descoberta da sexualidade, Aquilino preserva o papel da mulher como catalisadora da perdição humana. A conceção da figura feminina como culpada pela ruína que a sua curiosidade e lascívia trouxeram à espécie humana encontram-se tanto na mitologia cristã, com Eva, como na greco-romana, com Pandora. Proponho-me, portanto, a explorar as semelhanças entre estes dois mitos basilares para a perceção europeia do mundo (mesmo quando recontados), e a forma como influenciam os papéis de género na atualidade.

O primeiro ponto partilhado por Triunfal e o mito da Caixa de Pandora é o facto de a força divina ser retratada como uma entidade ameaçadora e vingativa. Em Triunfal, o deus veterotestamentário é responsável pelo fim da felicidade plena em que Adão e Eva viviam, no Paraíso. É ao informá-los de que tocar na sua “árvore da ciência” lhes traria inexorável ruína que deus cerceia a plenitude dos prazeres do Éden (“o receio de poderem, involuntariamente, trair o amo flutuava em seu cuidado e já enrugava a face lisa do seu mar de doçuras”). O deus veterotestamentário reveste-se, assim, de uma aura de ameaça e imprevisibilidade. Para além disso, a sua natureza inflexível e castigadora revela-se aquando da descoberta de Adão e Eva do “pomo proibido”: “Por cima deles repercutiu, a breve espaço, um formidável trovão que os atirou um contra o outro a bater os dentes de medo”, e, logo de seguida, a voz de deus “ribombou (…) entre as nuvens”, ordenando-lhes que deixassem o Paraíso e abandonando-os sem piedade às “mil tormentas” do mundo terreno. O mesmo traço castigador caracteriza os deuses do mito da Caixa de Pandora. Neste, Pandora é ela própria o castigo divino, enviado para entre os homens como retaliação pela ousadia de Prometeu, ladrão do fogo divino. Segundo a Teogonia de Hesíodo, Pandora, detentora de todos os dons, terá sido lançada à terra para seduzir os mortais e os conduzir à perdição. Assim, tanto o deus cristão como os deuses da mitologia clássica adotam, nestes mitos, uma postura rígida, quase malévola, que responde à irresponsabilidade dos mortais com o castigo desproporcional da ruína da espécie humana.

Também em ambos os registos se verifica a existência de um objeto proibido, cuja prova ou abertura desencadeiam uma série de consequências para a espécie humana. Em Triunfal, as consequências da sucumbência ao fruto proibido começam por ser enunciadas por deus: “Tu, homem, ias regar a terra com o suor do corpo; e tu, mulher, serias votada à condição da criatura mais frágil e cativa entre as criaturas. (…) Nesse fruto, meus meninos, estão açaimados todos os flagelos… ódio, ciúme, angústia… guerra…”, Já o desastre que se segue imediatamente à desobediência de Adão e Eva é a expulsão do Paraíso e a consequente queda para o mundo povoado por todos os males previamente enunciados. O foco desta narrativa é, portanto, uma incógnita cuja descoberta seria portadora de desgraças – pelo menos, segundo a autoridade divina. Isto, no entanto, não corresponde à conclusão do conto de Aquilino: a Adão e Ea junta-se “A criação inteira”, entoando repetidamente “Amor, és tudo!”. Assim, apesar da violação das ordens divinas e da condenação a uma vida de provações num mundo cruel, a descoberta do pomo proibido (neste caso, da sexualidade) traz ao Homem a possibilidade de fruir do prazer do orgasmo e de uma vida amorosa plena. Daí podemos inferir a defesa por Aquilino do carpe diem horaciano e de um vitalismo fundado na alegria do apego terreno. Por isso o seu conto tem como título Triunfal, uma afirmação da vitória do eros somatizado, causa de castigo divino e fonte de júbilo profano. Também o mito da Caixa de Pandora culmina na libertação de males e na descoberta de um bem. Pandora é enviada para junto dos homens com uma jarra que estava proibida de abrir. Contudo, a sua curiosidade leva a melhor e, quando abre a jarra (uma caixa, em relatos posteriores), liberta todos os males que a humanidade ainda não conhecia: o ciúme, a guerra, a doença, o ódio. No fundo da jarra, resta apenas a esperança. Portanto, a abertura da caixa de Pandora trouxe não só o conjunto de maleitas que assolam a vida terrena, como também a esperança que dá ânimo aos Homens para não desistirem de as enfrentar. Assim sendo, ambos os objetos proibidos (o de Triunfal e o do mito clássico) trazem, com a sua descoberta, um universo de infortúnios atenuado por algo positivo que traz à humanidade um motivo para os suportar.

Por último, Triunfal e o mito da Caixa de Pandora convergem na representação da mulher como veículo da tentação e da ruína. Eva é caracterizada por Aquilino como “um lambisco de primeira”, “curiosa”, “sagaz”, “tentadora e subtil”. É ela que insiste que deus revele aquilo que ela e Adão estão proibidos de descobrir, e ela que enceta a atividade sexual, “Rolando-se enervada e brincalhona” e pedindo a Adão que lhe faça “como as serpentes e como a nuvem”. Adão, por seu lado, é representado como um ser submisso, “cabeçudo” e, portanto, inocente no que toca à violação das ordens divinas. Isto reflete-se, aliás, na escolha de palavras de Aquilino na descrição do ato sexual: enquanto Eva “descaiu sobre nosso pai” e “tentou enlaçar-se” nos seus braços, Adão começou por “estir[ar] a perna num esticão nervoso” e, por fim, “acedeu”. O Génesis tornou-se numa lente através da qual a sociedade europeia construiu as noções de papéis de género, O homem, racional. Opõe-se à mulher, irracional e, por isso, inferior, culpável e perigosa na sua sedução. O mesmo acontece com Pandora, por vezes percecionada como a antecessora de Eva nas histórias de mulheres cuja curiosidade levou a melhor e condenou a humanidade ao sofrimento. Pandora, enquanto produto de uma trama divina com o fim de seduzir os homens e detentora de todos os dons, partilha com Eva o seu poder de enfeitiçar os pobres homens, cujo poder da razão nada pode fazer para resistir às suas artimanhas do plano sexual. Separa-as o nível de envolvimento dos seus pares masculinos no desencadeamento das consequências da sua curiosidade. Se, em Triunfal, o fruto proibido é o próprio ato sexual, de que necessariamente homem e mulher fazem parte, a afronta aos deuses de Pandora é feita sem mais intervenientes, ainda que os males por ela libertados afetem toda a humanidade.

Eva e Pandora, ambas a primeira mulher no mundo e criadas após o homem nas mitologias a que pertencem, são o epítome da figura feminina vencida pela curiosidade que destrói o mundo perfeito que os homens anteriores a elas conheciam. Apesar de a sociedade atual se ter vindo a distanciar dos dogmas religiosos, a preponderância da Igreja Católica europeia ao longo dos séculos e a herança greco-latina na Europa levaram a que histórias basilares como estas se tenham entranhado na mentalidade dos cidadãos. A mulher enquanto culpada pela ruína da humanidade metamorfoseou-se pelo discurso misógino numa criatura menos capaz, menos merecedora de oportunidades e menos preparada para gerir emoções e responsabilidades. Eva, mãe da humanidade, deve, na forma das mulheres de hoje, cumprir o seu “papel de mãe”. Pandora, símbolo da curiosidade irrefreável, deve agora saber controlar-se, não fazer perguntas e não ambicionar a mais do que o seu parceiro. É curioso que a emergência do discurso revivalista do patriarcado orgulhoso coincida com um período em que o estudo das humanidades em geral, e do estudo dos clássicos em particular, é desvalorizado e menosprezado em detrimento das valências científicas, e dificilmente poderá ser visto como uma coincidência.

Em suma, Triunfal de Aquilino estabelece um diálogo claro com o mito da Caixa de Pandora. Em ambas as histórias, as personagens estão sob o poder incontestável de uma divindade atemorizante e vingativa; ambas têm como tema central o conflito entre a curiosidade e a ordem divina, corporizada num objeto (que, em Triunfal, se revela um ato) cuja violação resulta num grande mal, compensado por um pequeno, mas poderoso bem; ambas colocam o fardo da responsabilidade pela desgraça na figura feminina, que em ambas é famosa pela sua sensualidade e astúcia. Ambas, enfim, são parte da herança cultural europeia e manifestação primária do estatuto desigual dos sexos, em relação ao qual ainda há muito a fazer.

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04
Jul24

"Triunfal", de Aquilino Ribeiro, e a Ilha dos Amores Camoniana

Helena

No seu conto Triunfal, Aquilino Ribeiro reconta o episódio genesíaco do pecado original, distanciando-se de texto bíblico ao transformar o momento em que Eva morde o fruto proibido na descoberta da sexualidade. O pendor sensual de Triunfal está intimamente ligado à descrição dos elementos da natureza que rodeiam as suas personagens, um espaço mítico erotizado que em muito se assemelha à Ilha dos Amores camoniana. Proponho-me, portanto, estabelecer um paralelo entre Triunfal e o episódio da Ilha dos Amores d’ Os Lusíadas, no que se refere à representação da natureza e da figura feminina que a povoa.

Aquilino parte do ideal católico do Jardim do Paraíso para a descrição do universo de perfeita harmonia em que habitam Adão e Eva. Contudo, a sua propensão para a filosofia do carpe diem e para a fruição dos prazeres terrenos leva-o a explorar o cenário genesíaco através de uma lente sensual. Assim sendo, o lugar onde Adão e Eva viviam “na plenitude de um gozo inapreciável” e onde “tudo era admirável” evolui para um cenário catalisador do ato sexual, o que, na reinterpretação de Aquilino, constituía o próprio pecado original. A natureza impele Adão e Eva para a descoberta do prazer carnal, sendo, portanto, um veículo para a glorificação do “Eros somatizado” que é central ao conto. Imediatamente antes de dar início à secção do clímax de Triunfal, Aquilino estabelece um ambiente que precede a sucessão de elementos eróticos que culminam na descoberta do “pomo proibido”: "Os animais (…) enlanguesciam em sonâmbula lassitude; já duas gazelas, na orla do Ribeiro, se perseguiam, arrifando. Agastadas, as flores caíam para a Terra, e no ar o pólen e os aromas (...) rebatiam-se sobre o solo”. A própria Eva enuncia o papel da natureza na facilitação do ato sexual quando refere que ela e Adão estão “enredados em hera” . É de realçar a escolha da hera como planta que envolve os pais da humanidade, tendo em conta que conota fertilidade, conexão e erotismo. À medida que a intimidade entre Adão e Eva avança salienta-se na natureza que os rodeia “aquela languidez; os bichos a arfar; o colapso das rosas; o estado de sideração do Jardim todo”. É, aliás, a imitação da natureza sensual que Eva pede a Adão imediatamente antes da consumação do pecado original, na versão de Aquilino: “Faze-me como as serpentes e como a nuvem”. Pode, portanto, concluir-se que a natureza é quase uma personagem em Triunfal, dada a sua ação catalisadora da descoberta da sexualidade pelos habitantes humanos do Éden, diretamente influenciados pelos seus elementos imbuídos de sensualidade.

Também a Ilha dos Amores (canto X d’ Os Lusíadas) está repleta de elementos naturais que prenunciam o caráter erótico da última paragem dos navegadores portugueses antes do seu regresso a Portugal. Vénus, adjuvante dos Lusitanos, cria esta ilha como recompensa pela coragem e pelo esforço que os portugueses demonstraram nas suas conquistas. Não são, contudo, apenas as belas ninfas com que Vénus povoa a Ilha o único elemento de sedução que os navegadores lá encontram. A elas junta-se uma conjuntura favorável à emergência do desejo sexual: “Na fermosa Ilha, alegre e deleitosa / Claras fontes e límpidas moravam / Do cume, que a verdura tem viçosa; / Por entre pedras alvas se deriva / A sonorosa linfa fugitiva”. A “fonte” e a “linfa”, aliadas à “verdura (…) viçosa”, remetem para as ideias de fertilidade e vitalidade, que encontram continuidade na descrição de árvores de fruto: “Mil árvores estão ao céu subindo, / Com pomos odoríferos e belos; / A laranjeira tem no fruto lindo / A cor que Dafne tinha nos cabelos. / Encosta-se ao chão, que está caindo, / A cidreira cos pesos amarelos; / Os fermosos limões ali, cheirando, / Estão virgínias tetas imitando”. Esta sequência, rica em sensações visuais e olfativas, estabelece uma relação clara com o ato sexual, particularmente da perspetiva estereotípica masculina: a mulher, prostrada como a cidreira, nua, com os seios semelhantes aos limões descritos por Camões como um elemento de forte apelo sexual. Assim, tal como em Triunfal, a natureza é descrita como uma entidade que favorece a propensão sensual das personagens da narrativa. Tal como o cenário que os envolve impele Adão e Eva à descoberta do prazer carnal em Triunfal, também n’ Os Lusíadas os navegadores portugueses são convidados a desfrutar dele, não só pelas ninfas belas e sedutoras, mas também pelos elementos naturais que põem em destaque o caráter sensual de toda a Ilha dos Amores.

A mulher é, em ambos os textos, representada como um objeto do desejo sexual masculino. Eva, um “lambisco de primeira”, emprega os seus poderes de sedução para levar Adão a cometer com ela o pecado original. Adão, inicialmente, “estirou a perna num esticão nervoso”, mas, por fim, “acedeu”, cedendo à insistência da “tentadora e subtil” mulher. N’ Os Lusíadas, as ninfas colocadas na Ilha dos Amores propositadamente para seduzir os navegadores portugueses também possuem a irresistibilidade da figura feminina talhada para satisfazer o homem. Com efeito. Vénus ordenara-lhes “Que andassem pelos campos espalhadas, / Que, vista dos barões a presa incerta, / Se fizessem primeiro desejadas. / Alguas, que na forma descoberta / Do belo corpo estavam confiadas, / Posta a artificiosa formosura, / Nuas lavar se deixam na água pura.” Eva e as ninfas são a tentação personificada, o recetáculo do homem que elas próprias atraem com sagacidade. No entanto, o seu estatuto enquanto figura feminina que habita um universo povoado por homens não é o mesmo. Eva, em Triunfal, é o veículo do pecado, a incitadora à desobediência e a culpada pela ruína da humanidade. A mulher genesíaca que Aquilino retoma é quem desencadeia o primeiro grande castigo da raça humana: a expulsão do Paraíso e a consequente vida num mundo de “flagelos… ódio, ciúme, angústia… guerra…”. Aquilino atenua a carga pejorativa da figura de Eva através de um final que ressalva as possibilidades que por ela foram abertas aos Homens: o prazer carnal e a vivência plena do amor, que é “tudo”. Ainda assim, e contrariamente ao submisso e inocente Adão, Eva continua a ser aquela que trouxe o pecado, e com ele todas as angústias da existência, à espécie humana. Por seu lado, as ninfas da Ilha dos Amores, desprovidas de más intenções e não acarretando terríveis consequências para o futuro da humanidade, são apresentadas como um prémio para uma fruição plena dos prazeres terrenos. Enquanto a sedução de Eva é contrária às ordens divinas, a das ninfas corresponde ao cumprimento escrupuloso das instruções de uma divindade. Eva, transgressora, contrasta com as ninfas, ofertas benignas. O ato sexual, o terrível pomo proibido de Triunfal, encontra uma valorização positiva n’Os Lusíadas – os deuses não só o toleram, como o incentivam. Em suma, em ambas as obras, a figura da mulher é dotada de um forte traço sensual, mas este resulta em consequências diferentes para a sua perceção no que toca ao estigma da culpa. Eva, a primeira mulher, estabelecerá o precedente para a condição inferior da mulher nas sociedades influenciadas pela leitura do Génesis, enquanto ser incapaz de resistir à tentação, de controlar emoções e de gerir responsabilidades. As ninfas da Ilha dos Amores, desprovidas de poder e de personalidade, não carregam o fardo da culpa da queda da raça humana, embora também contribuam para a conceção misógina da mulher enquanto recetáculo incondicional e alegre do desejo do homem.

Conclui-se, portanto, que, embora pertençam a épocas de produção literária distintas e consistam em narrativas muito diferentes, Triunfal e o episódio da Ilha dos Amores n’ Os Lusíadas se tocam em aspetos que envolvem a representação da natureza e da figura feminina. Em ambos os textos, o cenário natural em que as personagens se movimentam é fundamental para o estabelecimento de um ambiente propenso à atividade sexual, recorrendo-se, por vezes, ao simbolismo. Também em ambos a mulher é representada como um ser fundamentalmente sensual, embora, em Triunfal, seja atribuído à mulher o fardo da culpa da ruína da humanidade, enquanto as ninfas preservam o estatuto de prémio providenciado pelos deuses – “O prémio, lá no fim, bem merecido”.

10
Jan23

“The Woman Destroyed” – Simone de Beauvoir

Helena

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The Woman Destroyed é um conjunto de três textos da autoria de Simone de Beauvoir, atravessados pela mesma sensação de desespero de mulheres que se encontram, de uma forma ou de outra, numa fase difícil da sua vida. No primeiro texto, The Age of Discretion, Beauvoir apresenta-nos o dilema de uma mulher enquanto mãe que se depara com a revelação dos ideais de vida do seu filho, contrários àqueles que ela tentara transmitir-lhe. O segundo texto, Monologue, é o fluxo de consciência de uma mulher sozinha no seu apartamento na noite de Ano Novo, à deriva na sua frustração resultante da perda de uma filha e de um processo de divórcio turbulento. O último texto, que dá nome ao livro, leva-nos a acompanhar a jornada de Monique, uma mulher de 44 anos que vê o seu casamento escapar-se-lhe por entre os dedos depois de descobrir que o marido tinha vindo a envolver-se com outra mulher.

Assim, três breves histórias transportam-nos para o universo feminino da década de 60, retratando dilemas e preocupações que poderiam pertencer a mulheres dos nossos dias.

“One always has to wait until the sugar melts, the memory dies, the wound scars over, the sun sets, the unhappiness lifts and fades away.”

Simone de Beauvoir, um ícone do movimento feminista dos anos 60 do século XX, apesar de toda a polémica que a ela está associada, representa em The Woman Destroyed três mulheres que foram, de uma forma ou de outra, destruídas pelas reviravoltas da vida.

Esta leitura foi particularmente cativante pela forma única como a autora retrata as vivências de mulheres frustradas, desesperadas, encurraladas por circunstâncias que não desejavam nem poderiam prever. O primeiro texto apresenta-nos uma faceta pouco explorada da maternidade, com o conflito interno de uma mulher desencadeado pela manifestação por parte do seu filho de objetivos e ambições que chocam a sua progenitora e desestabilizam por completo a harmonia familiar. O segundo texto, aquele de que gostei menos, por ser algo caótico e confuso, coloca sob os holofotes uma mulher duplamente afetada pela perda, num retrato exasperante da solidão e da revolta. The Woman Destroyed, o meu texto preferido, apesar de se ter revelado algo repetitivo, é bem-sucedido na forma como transmite o desespero palpável de uma mulher que se afunda num redemoinho mental e emocional. Ao mesmo tempo, provoca reflexões acerca da amizade, da maternidade e da verdadeira medida em que conhecemos aqueles que nos são mais próximos.

The Woman Destroyed é um livro que recomendaria a alguém que manifestasse interesse em conhecer a obra de Beauvoir e preferisse narrativas ficcionais à não-ficção.

“What a relief! It is so tiring to hate someone you love.”

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