“A morte de Ivan Ilitch” – Lev Tolstoi
A morte de Ivan Ilitch inicia-se com a notícia da morte enunciada no título e com as consequentes preocupações dos familiares de Ivan Ilitch relativamente à sua herança e dos seus colegas de trabalho sobre as novas posições que este acontecimento os levaria a ocupar na hierarquia laboral. Através de uma analepse, recuamos no tempo até à juventude de Ivan Ilitch e acompanhamos a sua consistente subida de postos nos trabalhos que desempenhava, através de métodos mais ou menos honestos que, a seu ver, eram apenas necessários. Após uma nova promoção, uma melhoria na relação com a sua esposa e o início do processo de mudança de casa, tudo parecia promissor na vida de Ivan Ilitch. Contudo, uma queda inesperada durante as mudanças desencadeia um processo de degradação inesperada na sua pessoa. Inicialmente focado na determinação da fonte da dor que sentia e do seu tratamento, Ivan Ilitch cai gradualmente no desânimo e na descrença e acaba por aceitar aquilo que lhe parece óbvio e inevitável: o seu mal não corresponde a um problema orgânico específico, mas sim à chegada certa e gradual da hora da sua morte. Desacreditado pela família e incompreendido pelos médicos, Ivan Ilitch envereda por uma descida em espiral que o levará a reavaliar toda a sua vida e a questionar a noção terrível da morte que persegue os Homens desde tempos imemoriais.
“a própria morte de um conhecido próximo provocava, como sempre, um sentimento de alegria: quem morreu foi ele, e não eu.”
Evidenciando a solidão a que é votado um ser humano vítima de uma degradação física e psicológica de que não tem culpa, Lev Tolstoi explora realidades que Kafka retoma na sua Metamorfose, em que Samsa, transformado em escaravelho do dia para a noite, se vê repentinamente ostracizado e desprezado pelos seus próprios entes familiares.
Através de um estilo desprovido de figuras estilísticas que o embelezem, mas também que o enfraqueçam, Tolstoi constrói um retrato cru e comovente da descida de um homem às profundezas de si próprio, ao seu passado e às suas crenças.
Este é um livro profundo na sua simplicidade, uma reflexão sobre as relações interpessoais, sobre a vida e sobre a morte, que se pode ler de uma assentada.