“And Then There Were None” – Agatha Christie
Oito pessoas que não se conhecem reúnem-se numa ilha isolada na costa de Devon, a propósito em virtude de de um convite por parte de um casal com que nenhum deles é especialmente familiar – os Owens. Quando chegam à mansão minimalista do casal, esperam-nos apenas dois criados, que lhes garantem pouco ou nada saber sobre os donos da propriedade, apenas que estes se juntariam a eles mais tarde. No entanto, nessa noite, um dos convidados morre asfixiado, ainda antes da chegada de qualquer anfitrião. A voz de uma gravação acusa cada um dos convidados de um crime pelo qual nunca foram julgados e que a maior parte deles se esforça por restringir à sua consciência. O círculo de dez figurinhas sobre a mesa de jantar vê-se misteriosamente reduzido a nove.
À medida que os assassinatos se sucedem, os hóspedes começam, em vão, a tentar ludibriar o assassino, que, contrariamente ao que inicialmente pensavam, se encontra entre eles. Mr. e Mrs. Rogers, Vera Claythorne, o Dr. Armstrong, Lombard, Blore, o general MacArthur e Emily Brent cairão um a um, da forma mais incontrolável e imprevisível, no esquema sanguinário do enigmático U. N. Owen.
« He paused:
"You'll be cold, perhaps, in that thin dress?"
Vera said with a raucous laugh:
"Cold? I should be colder if I were dead!" »
Agatha Christie afirmava que And Then There Were None tinha sido o seu livro mais difícil de construir. Isso é compreensível, já que se distancia dos universos de Poirot e de Miss Marple na medida em que não existe uma personagem externa astuta para juntar as peças da intriga e resolver o mistério. Isto agradou-me sobremaneira, já que costuma incomodar-me a facilidade sabichona com que é costume Poirot chegar-se à frente, no fim dos romances, para explicar detalhadamente todo o sucedido, como se tudo fosse óbvio. Pelo contrário, as figuras da autoridade a que é atribuído o caso destes assassinatos em série interpretam mal os sinais deixados pelos cadáveres na ilha. Assim, por ser um enigma que se desenrola de dentro para fora, compreende-se que tenha sido um romance de elaboração desafiante, mas também que a sua leitura seja extremamente aliciante.
O leitor fica preso neste loop de assassinatos, tentando, em conjunto com as personagens, prever quem vai ser o próximo a morrer e de que forma. O facto de, sabendo isso ou não, dificilmente se poder evitar o encadeamento de assassinatos, aliado à reclusão das personagens numa pequena ilha deserta, confere ao enredo uma forte sensação de claustrofobia e inevitabilidade.
Apenas aponto dois aspetos negativos nesta narrativa: o elevado número de personagens, presas no mesmo sítio e com muitas interações, mas apresentadas todas de seguida logo no início, leva a que seja fácil confundi-las entre si; e a atitude final de Lombard não me pareceu adequada ao desfecho da obra. Fora isso, recomendo este clássico moderno – um mistério intrincado e cativante, como aqueles a que Agatha Christie habituou o seu público.