“Instruções para salvar o mundo” – Rosa Montero
“Instruções para salvar o mundo”, escrito por Rosa Montero, foi editado em Portugal, em 2008, pela Porto Editora.
Entre o emaranhado de pessoas que todos os dias andam de um lado para o outro na grande cidade de Madrid, contam-se Matías, um taxista viúvo, Daniel, um enfermeiro frustrado, Cerebro, uma velha cientista, e Fatma, uma prostituta feliz. Apesar das suas colossais diferenças, todos eles acabarão por cruzar e marcar as vidas uns dos outros.
Matías deixara de acreditar na possibilidade de ser feliz a partir do momento em que perdera Rita, a sua mulher, vítima de um cancro raro e fatal. Preso num mundo cinzento que teimava em trazer-lhe recordações da sua mulher, Matías refugiava-se no bar Oasis durante as horas que não passava ao volante do seu táxi. Quando, inesperadamente, é abordado por Cerebro, uma idosa respeitável e sombria que passava as noites a diluir as recordações no álcool, reencontra o seu prazer de aprender sobre a vida e sobre o mundo. Cerebro fala ao taxista sobre a tendência do universo para a ordem e a simetria, sobre o impacto de ações isoladas em escalas inimagináveis e sobre a probabilidade de a uma coincidência se seguirem outras.
Paralelamente à vida de Matías, desenrola-se a de Daniel Ortíz, um enfermeiro que perdera a paixão pela sua profissão há muitos anos e cujo casamento apenas se mantinha por preguiça e comodismo. Enterrado na inércia e na passividade sobre as quais alicerçara a sua personalidade, Daniel encontra refúgio no Second Life, uma plataforma virtual que oferece aos seus utilizadores a possibilidade de criarem uma vida completamente diferente da sua, num universo independente povoado por todas as outras pessoas às quais a vida real não bastava. O quotidiano de Daniel é tão monótono e entediante que não faz ideia de que, algures nas suas consultas nas urgências do San Felipe, tenha diagnosticado incorretamente aquilo que se viria a revelar um cancro raro e fatal, o desmoronamento da alegria e dos sonhos de um taxista a quem só resta o desejo de vingança e as conversas num bar.
Enquanto tudo isto se desenrola, os noticiários transmitem os mais recentes assassinatos perpetrados pelo “assassino da felicidade”, cuja identidade se desconhece e que elege como vítimas os idosos vulneráveis de quem já ninguém se lembra.
“Ya sabes, somos polvo de estrellas.”
Rosa Montero volta a construir um romance fundado na revolta e na exasperação desenterradas pelo luto. Por ter vivido uma situação semelhante àquela por que Matías passa nesta narrativa, a autora consegue concretizar um retrato fiel do processo de perda, do desespero face à inexorabilidade da doença e na necessidade irracional de encontrar alguém para culpar, para encarnar a causa de todo o sofrimento. Apesar de ser notório que Rosa tenha encontrado uma zona de conforto na narração do luto, da morte e do cancro, o que torna as suas obras algo repetitivas, é inegável que o faz de um modo credível e cativante.
Este livro orbita em volta de pessoas banais com vidas banais. Afinal, nem todas as histórias que valem a pena ser contadas precisam de ter protagonistas excecionais. Nesta narrativa, nenhuma personagem é perfeita, nem particularmente especial. É uma narrativa sobre vidas medíocres e círculos viciosos, sem que isso impeça que também transmita uma mensagem de esperança, a certeza da possibilidade de, a qualquer momento e por qualquer motivo, se mudar de vida.
Em resumo, Instruções para salvar o mundo é um romance acerca da desesperada necessidade humana de ser feliz e da resiliência inimaginável de que os Homens são dotados quando se trata de sobreviver.