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H-orizontes

H-orizontes

28
Jun23

“Mar Negro” – Ana Pessoa e Bernardo P. Carvalho

Helena

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Inês e J.P. trabalham no bar da praia durante um verão que se aproxima do fim. Os clientes vão e vêm, e os gelados Mar Negro encomendados em grande quantidade saem a voar. A relação entre Inês e J.P. é a de duas pessoas que, apesar de muito diferentes, são reunidas pelas circunstâncias e acabam por desfrutar da companhia um do outro.

Tudo parecia encaminhar-se para um final de estação tranquilo, quando, certo dia, uma rapariga morre afogada no mar. Tratando-se de uma cliente habitual do bar da praia, Inês não pode deixar de se sentir incomodada pelo sucedido, nem resiste a guardar para si a mala que a rapariga, também chamada Inês, deixara no bar por esquecimento.

Numa fase de transição entre as estações do ano e da vida, Inês percorre um caminho de novas descobertas, sensações e experiências que contribuirão para a consciência de si própria e dos outros.

Ana Pessoa e Bernardo P. Carvalho voltam a enveredar pelo mundo das bandas desenhadas pouco convencionais, com uma narrativa completamente ilustrada a duas cores e disposta em vinhetas de formas invulgares.

Tendo lido a banda desenhada publicada previamente pelos mesmos autores (Desvio), posso afirmar que gostei mais da anterior, já que a originalidade da narrativa me cativou mais. Por outro lado, entendo que a representação literária do quotidiano mais vulgar possa ser percecionada como um olhar claro sobre a vida de todos os dias e um testemunho de um período com características específicas. Assim, nestas páginas azuis e brancas, eternizou-se um fragmento da existência, a realidade de um trabalho de verão no bar da praia, das primeiras paixões e dos dilemas que o crescimento não deixa de trazer.

Assim, Mar Negro é uma boa leitura para uma tarde quente e descontraída de verão, tanto para jovens adultos (leitores cujos pensamentos, comportamentos e modos de expressão Ana Pessoa continua a captar maravilhosamente) como para adultos com vontade de regressar a uma juventude à beira-mar.

27
Jun23

“Levantado do Chão” – José Saramago

Helena

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Com uma ação situada no seio do Alentejo, durante a ditadura salazarista, Levantado do Chão acompanha a jornada de quatro gerações de trabalhadores rurais e as suas lutas sucessivas pela conquista de direitos laborais.

Ao longo de 290 páginas, a família Mau-Tempo debate-se com os ciclos de miséria e exploração que parecem inexpugnáveis nos latifúndios alentejanos que assentam, tal como a ditadura em vigor, numa hierarquia rígida e impermeável a considerações de misericórdia em relação aos subordinados. Assim, os Mau-Tempo e os que os rodeiam lutam cada dia pela sobrevivência a mais um ano de escassez e de jornadas de trabalho desumanas. Abafadas as revoltas pela PIDE, pela guarda, pela influência da religião, resultando delas mortos, presos, feridos, o povo não desiste da esperança na madrugada que há de vir e dar a conhecer aos trabalhadores o significado da palavra liberdade.

“e todo o mais deste destino está explicado nas linhas de ir e voltar”

Este é um daqueles livros que terei de reler mais tarde, numa altura, quem sabe, mais propícia à apreciação de todas as suas potencialidades. Esta experiência de primeira leitura não foi muito boa, por uma série de razões.

Em primeiro lugar, fui interrompendo esta leitura com outros livros que precisava de ler para outros trabalhos, e isso afetou bastante a fluidez da narrativa. Como se trata de um romance sobre gerações, é fácil que o leitor se perca entre os nomes e as relações entre as personagens, principalmente se não fizer uma leitura consistente e atenta (como foi o meu caso).

Em segundo lugar, a história não me cativou muito, exceto pelo facto de remontar a um contexto espácio-temporal que me interessa particularmente. Os ciclos repetitivos, apesar de intencionais, pareceram-me demasiado repetitivos, ao ponto de tornar a narrativa aborrecida e previsível.

Para além disso, nenhuma personagem me marcou muito por ser muito diferente das outras. É de realçar o episódio da tortura de António Mau-Tempo enquanto testemunho dos mecanismos de repressão do regime salazarista, mas, ainda assim, o seu propósito de vida era o mesmo que o de todas as outras personagens, e a sua trajetória na narrativa bastante linear.

No entanto, reconheço que esta é uma obra fundamental para o aprofundamento da compreensão da vivência dos trabalhadores agrícolas do período salazarista, e para que se recordem as múltiplas e terríveis armadilhas do fascismo. É, ainda, o romance inaugural do estilo saramaguiano, pautado pela fluidez do discurso intercalado com reparos mais ou menos subjetivos por parte do narrador.

Em suma, este não é um romance célebre pelas suas personagens extraordinárias e reviravoltas na ação, mas pela maneira como captura, como que pelos olhos de muitas pequenas formigas, a forma como a soma do sofrimento das gerações que tentaram “levantar-se do chão” possibilitou que, eventualmente, uma delas pudesse usufruir do poder de trabalhar digna e livremente.

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