“Ilíada” – Homero
Troia, Época Homérica. No último ano da Guerra de Troia, que opôs gregos e troianos, Agamémnon, comandante das tropas gregas, toma uma decisão que afetará profundamente o rumo dos acontecimentos. Depois de se ter visto obrigado a entregar a cativa Criseida ao pai dela, sacerdote de Apolo, Agamémnon exige a Aquiles que lhe ceda a escrava Briseida, que lhe fora atribuída como prémio de guerra. Ultrajado por esta desonra, Aquiles volta as costas ao exército grego e recusa-se a continuar a lutar em seu favor. Para além disso, este semideus recorre à sua mãe, Tétis, pedindo-lhe que interceda junto de Zeus e o convença a fazer com que os gregos paguem pela ofensa que Agamémnon lhe infligiu.
A partir daí, a situação vantajosa em que os gregos se encontravam em relação aos seus inimigos começa a deteriorar-se. Na ausência do seu guerreiro mais ágil e valente, os gregos batalham ardentemente pelo fim de uma guerra que já custara demasiado a todos os envolvidos. Até os deuses tomam fações e se defrontam pela vitória numa luta pela posse da mulher mais bela da Grécia.
Eu não acredito que acabei de ler o primeiro livro da História Ocidental.
Como a minha professora de Cultura Clássica me ensinou, este é um livro sobre a raiva de Aquiles. A história começa com o despoletar da sua fúria, desenvolve-se durante o período da sua ausência, motivada pelo rancor, e termina com a explosão da sua raiva. Para além da cólera de Aquiles, contudo, muitas outras cóleras desabrocham a cada passo que se percorre na Ilíada: a cólera de Heitor para com Páris, pela debilidade do seu caráter; a cólera de Agamémnon para com Aquiles, por ter posto em risco a vida dos gregos por causas menores; a cólera de todos contra a guerra, que se prolongava por demasiado tempo e causava demasiados danos. Assim, podemos dizer que Ilíada é uma história movida pela força da raiva.
Esta também é uma história sobre o destino e sobre a glória. Na Grécia Antiga, a glória era um valor essencial para a vida. O principal objetivo de um homem era ser recordado para a eternidade pelos seus feitos, e a melhor forma de o fazer era através do seu desempenho na guerra. Assim, apesar de estarem fadados a uma morte dolorosa, os heróis homéricos valorizam a bravura e chegam, como no caso de Aquiles, a recusar a possibilidade de uma vida longa em troca da perpetuação do seu nome.
Aquilo que mais me surpreendeu na Ilíada foi a violência com que são descritas as mortes no campo de batalha. Desde miolos borrifados e pescoços trespassados até olhos a saltar e pulmões a ser arrancados por lanças, a Ilíada é um autêntico catálogo de atrocidades da guerra.
Não teria desfrutado tanto nem compreendido tão facilmente esta obra épica se não fosse pela tradução impecável de Frederico Lourenço, cujo domínio simultâneo da forma e do conteúdo é notório na forma como consegue traduzir um documento milenar para o público dos nossos dias.
Em conclusão, apesar das suas longas enumerações de guerreiros, confrontos e patronímicos, a Ilíada é um ícone da história literária que, para além de ser enriquecedor e fascinante, chegou a proporcionar-me momentos de diversão e uma autêntica viagem no tempo.