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H-orizontes

H-orizontes

27
Mar20

"Felizmente há luar!" – Luís de Sttau Monteiro

Helena

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A ação deste livro desenrola-se em Lisboa, durante o período que antecedeu o fracasso da conspiração de Gomes Freire de Andrade contra o domínio inglês em Portugal (1817).

As personagens dividem-se entre admiradores do general Gomes Freire e apoiantes do regime (alguns deles populares, a quem traria benefícios simular o apoio ao regime). Estes últimos tentam perceber quem são os responsáveis pela conspiração acerca da qual circulam rumores.

Deparamo-nos com a hipocrisia de alguns populares, com a indiferença de Beresford face aos portugueses, com a indignação da mulher de Gomes Freire, com o descontentamento generalizado em relação ao regime vigente e com a tristeza do povo pela a morte do general e pelo fracasso da conspiração. “É verdade que a execução se prolongará pela noite, mas felizmente há luar…”

Este texto despoletou-me, inicialmente, muito interesse, pois está intimamente ligado a um período histórico que tinha estudado há pouco tempo: a revolução liberal portuguesa e os seus antecedentes. Assim, foi com entusiasmo que vi retratados no livro o domínio inglês sobre Portugal após a expulsão das tropas francesas, a miséria de povo, a permanência da sociedade de ordens, a necessidade da expansão da rede de ensino, o caráter repressivo da governação inglesa e, claro, a conspiração de Gomes Freire de Andrade de 1817.

Quanto à narrativa em si, não a achei muito interessante: é linear, simples, não é surpreendente… Para além disso, é um texto dramático, género cuja leitura não costuma entusiasmar-me.

Recomendo, contudo, a sua leitura a estudantes de História do 11º ano.

“Os degraus da vida são logo esquecidos por quem sobe a escada…”

25
Mar20

"Farsa de Inês Pereira" - Gil Vicente

Helena

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A Farsa de Inês Pereira é uma obra de Gil Vicente, baseada no mote “Mais quero asno que me leve do que cavalo que me derrube”. Tendo como tema central o engano, relata a história de Inês, uma jovem indignada por estar fechada em casa e que sonha casar com um homem “discreto” e “avisado”. Depois de recusar o rude Pêro Marques, casa com o escudeiro Brás da Mata, que se revela um marido tirano e ciumento. Após a morte deste em África, Inês decide casar com Pêro, que lhe faz todas as vontades, inclusive a de a levar comicamente ao encontro do clérigo com quem ela o trairá.

Esta obra, para além de cativante, realça através da comicidade os defeitos da sociedade vicentina, alguns dos quais ainda são aplicáveis à sociedade atual. Com um enredo interessante e imprevisível, é um livro que aconselho a todos, que garante um bom momento de riso e nos leva a refletir acerca de questões como a hipocrisia, a liberdade e a insatisfação.

Uma obra curta, acessível e moralmente instrutiva, de leitura obrigatória para o 10º ano de escolaridade.

20
Mar20

"Fahrenheit 451" - Ray Bradbury

Helena

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“451º F: temperatura a que o papel dos livros atinge o ponto de ignição e é consumido pelo fogo.”

Guy Montag, a personagem principal desta história, é bombeiro. Contudo, nesta cidade de um futuro distópico, a função dos bombeiros não é apagar fogos, mas sim queimar livros proibidos e as casas daqueles que os escondem. Este é um trabalho que Guy desempenha com prazer e sem levantar qualquer objeção ou dúvida, até conhecer Clarice McClellan. A rapariga de 17 anos, que se autointitula “meio louca”, apresenta a Montag uma perspetiva diferente em relação à vida, em que se presta atenção aos detalhes, em que se tira tempo para pensar, em que se aprecia a Natureza e em que se questionam as normas sociais passivamente aceites pelas massas. O colapso das convicções de Montag dá-se após o incêndio da casa de uma velha que guardava livros. Contrariamente ao que costumava acontecer, a idosa recusou-se a abandonar a casa, tendo sido queimada juntamente com os livros. Tal sacrifício faz com que Guy se interrogue acerca do que terão os livros de tão importante para que haja pessoas dispostas a dar a vida por eles. Assim, o desenrolar do livro assenta no despertar de Montag para o mundo da literatura e na sua tomada de consciência acerca do que o rodeia: uma sociedade oca, egocêntrica, insensível e imediatista, um mundo superpovoado, a abundância de tempo livre, que não é sinónimo de tempo para pensar, e a desvalorização de tudo o que exija um processo de reflexão e espírito crítico.

Este livro foi escrito em 1953 e o mundo de alienação que retrata é assustadoramente semelhante ao atual. Desde as “Conchas” que as pessoas utilizavam permanentemente nos ouvidos (comparáveis aos earphones de hoje), até ao encurtamento das manifestações culturais (“novelas de cinco minutos”) e à dificuldade em manter a concentração por muito tempo ou em alimentar uma conversa, as diretrizes da sociedade hedonista do futuro projetada por Bradbury não tardarão a encontrar correspondência na realidade, se a nossa evolução continuar neste sentido. Por isso, considero de extrema importância a leitura de livros como este, após a qual todos ficamos mais atentos às nossas atitudes e adotamos uma posição mais crítica em relação à ação das massas. Ainda podemos evitar a transformação do mundo que conhecemos num enredo de um livro de ficção científica.

Para além de ser um alerta para o esmorecimento dos valores da sociedade, esta obra é um louvor aos livros, ao seu poder de preencher os leitores, de suscitar reflexões, de transportar quem os lê para um universo paralelo e para nos munir da arma mais poderosa de todas: o conhecimento.

É uma apologia às manifestações culturais, à apreciação da Natureza e à valorização dos momentos de solidão e silêncio. Uma obra de leitura que considero obrigatória, que nos faz refletir acerca do caminho que a sociedade toma nos dias de hoje.

“Olha, olha, o homem está a pensar!”

“vivemos na era do lenço descartável. Assoamos o nariz em alguém, apertamo-lo numa bola, atiramo-lo fora, pegamos noutro, assoamos, fazemos uma bola, atiramos fora”

“Porque hoje toda a gente sabe, com absoluta certeza, que nada me acontece. Só os outros morrem, eu não. Não há consequências nem responsabilidades. (…) O problema é que, quando as consequências o atingem, já é tarde de mais”

“ninguém é uma ilha isolada, mas algumas pessoas são livros.” (Posfácio)

17
Mar20

"Histórias Extraordinárias" - Edgar Allan Poe

Helena

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Esta coletânea de contos de um dos mais aclamados mestres do terror de todos os tempos reúne os títulos “A pipa de amontillado”, “O coração delator”, “A caixa longa”, “Morella”, “O gato preto”, “O poço e o pêndulo”, “O demónio da perversidade”, “Metzengerstein”, “O enterro prematuro”, “O escaravelho de ouro”, “A esfinge”, “Ligeia”, “Berenice”, “William Wilson” e “Manuscrito encontrado numa garrafa”. De todos eles, só “Berenice” tem um narrador identificado: Egeu. Apesar de todos os contos serem marcados pela bizarria e por um certo distúrbio psicológico que atormenta alguma das personagens, é difícil resumi-los como um todo. Por isso, resumirei apenas “O gato preto”, uma das minhas três histórias preferidas (juntamente com “O coração delator” e “Berenice”).

O narrador deste conto era conhecido, durante a sua infância, pelo seu “temperamento dócil e amigável” e pelo seu gosto por animais. Teve um casamento feliz e, depois dele, vários animais de estimação. O seu preferido era o gato negro, Plutão, que era como a sua sombra sempre que estava em casa. Contudo, o caráter do narrador foi-se alterando ao longo dos anos, tornando-se mais insensível, irritável e violento. Numa noite em que voltava a casa “bastante intoxicado”, agarrou o gato e este mordeu-lhe a mão. Enfurecido e descontrolado, o narrador pegou num canivete e arrancou-lhe um dos olhos a sangue frio. Com o passar do tempo, o animal foi recuperando, embora tenha passado a fugir permanentemente do dono. Mas é a partir da manhã em que o narrador se deixa dominar pela “perversidade” e enforca o gato num ramo de árvore que a desgraça cai sobre ele, num clima de tensão crescente adensado pelo aparecimento de um outro gato preto, parecido com Plutão em todos os aspetos, exceto numa grande mancha branca que lhe cobria o peito. Este é, sem dúvida, um dos melhores contos do Mestre da Literatura Fantástica.

Edgar Allan Poe deixou um enorme legado na literatura do terror, com um espólio de contos imenso. “Histórias Extraordinárias” é uma compilação de alguns dos seus contos mais icónicos, permitindo ao leitor uma breve, mas marcante, incursão no universo macabro deste autor.

É apanágio dos contos o jogo do autor com a mente e com as fraquezas psicológicas humanas, como a perceção dos objetos consoante a sua distância em relação ao observador ou o peso da consciência após uma ação errada. Muitos dos textos podem parecer desprovidos de sentido, mas é sempre bom lê-los para apreciar a construção da trama e do ambiente no interior da mente do narrador. Os desfechos são inesperados e macabros, e o teor obscuro das histórias, ainda que não excessivamente aterrorizante, deixa bem claro o registo literário de Poe, posteriormente replicado por Bram Stoker.

“Quem é que não se viu já, muitas vezes, a cometer um ato vil ou idiota por nenhuma outra razão do que a de saber que não deve? Não temos todos nós uma inclinação perpétua, à flor da pele, para violar o que é Lei, só porque a entendemos como tal?” – Edgar Allan Poe, O gato preto.

13
Mar20

"Tormenta" - Julie Cross

Helena

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O primeiro volume da trilogia Tempest insere-nos na vida de Jackson, um universitário de 19 anos que consegue viajar no tempo. No entanto, as viagens no tempo não funcionam como nos filmes: estão divididas em “saltos parciais” e “saltos completos”. Os saltos temporais parciais permitem a Jackson visitar o passado e interferir com o que acontece nele, sem consequências no presente. Os saltos temporais completos alteram a chamada “home base” do viajante, como se o momento do passado para que saltou se tornasse o presente. Como tal, as alterações realizadas no passado durante um salto completo implicam mudanças no futuro. Jackson ainda não conhece totalmente as suas capacidades nem o funcionamento das viagens no tempo, e limita-se a fazer saltos parciais, em testes que o seu amigo Adam acompanha afincadamente. Jackson e Adam mantêm estes testes longe do conhecimento de todos, incluindo de Holly, a namorada de Jackson, mesmo que ela suspeite que o jovem lhe esconde algo e isso leve a discussões entre os dois. É depois de uma dessas discussões que irrompem no quarto de Holly dois homens que procuram Jackson, mas que ele desconhece. Após uma conversa confusa e pouco amigável, um dos homens dispara sobre Holly e Jackson sente-se saltar no tempo, aterrando no ano de 2007. Contudo, desta vez o salto foi completo, e Jackson não sabe como voltar a alterar a sua home base… É uma aventura através do tempo que começa com o propósito de evitar a morte de Holly, mas que acaba por envolver questões familiares, organismos secretos e grupos rivais de viajantes no tempo.

Honestamente, este não seria um livro que compraria por minha vontade. A capa não me atraiu particularmente, a sinopse não indicava um enredo denso e constituía o primeiro livro de uma trilogia, cujos restantes livros não tencionava ler. Como tal, não o comprei: foi-me oferecido. Ainda assim, não tardei a começar a lê-lo, e fiquei surpreendida com o interesse que me despertou, não especialmente pelo conteúdo, mas pela descontração que encontrei enquanto o lia.

Como referi, o enredo não é denso, pelo contrário, é muito simples. Apesar dos avanços e recuos no tempo, só há uma linha narrativa. A estrutura frásica é básica e o vocabulário empregue é extremamente comum. Os pontos mais fracos que tenho a apontar são a exploração fraca das personagens, o que confere ao livro um caráter muito bidimensional, e as gralhas da tradução, quer a nível da escrita das palavras, como a nível da coesão frásica (por vezes, o tempo e pessoa verbais não estão de acordo com o sujeito, por exemplo).

Por outro lado, é um livro muito leve, agradável, com um final algo inesperado, que considero ótimo para passar o tempo ou para dar algum descanso ao cérebro sobrecarregado com as preocupações do dia a dia atribulado. Ainda assim, continuo a não tencionar ler o resto da trilogia.

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